sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Tempo

Ana Carolina

Chuva fina batendo na vidraça, o cheiro de laranja no fundo do quintal, os passos dela na varanda junto aos meus suspiros afastando as cortinas. Ela combina a blusa com o sapato, a bolsa com a flor no cabelo, a boca com o meu paladar, saboroso como o chuvisco que falo.

Em dois minutos ela entrará pela porta.
- Não encontro minha pulseira dourada.

- Está no banheiro.

- Já procurei e não encontro.

- Está no banheiro, tenho certeza.

Eu, sentada na escrivaninha, não desvio os olhos do jornal e o café já frio.

- Não vais levar um casaco?

- A chuva já está parando.

- Mas o frio não.

A pulseira está ao lado do perfume no banheiro, como eu havia dito. Ela não levou o casaco e a chuva permanece. Deixou a sombra de seu despeito no parapeito da minha incerteza. Pensa que eu gostaria é de prendê-la em meus braços e nunca deixa-la ir. Pensa certo. Invariavelmente e para minha solidão, ela parte.
Espalho meus olhos pelo vão que deixou na porta enquanto o dia termina. O sol invadindo a persiana, sinto o toque delicado dos seus pés frios nos meus.
- Te amo. – ela me sussurra.

Adormeço.









domingo, 14 de novembro de 2010

Doce

Joan Miró



É simples, suave, doce...
É pleno
É como um míssil de saudade
Um alimento pra alma
É poesia que não se escreve
É inspiração
É um grito, um suspiro
É uma dorzinha escondida no peito
É a felicidade mais contida
É do torpe o florescer
É um florescer completamente único
Eternamente simples e suave
Eternamente doce...


                                                                                                                                       


sábado, 6 de novembro de 2010

Violeta


Francisco Goya


Eu quero me submeter a extremos violeta
Deixar de tocar o solo 
Sem dispor de uma só pausa dedilhada 
Quero conter-me nos silencios intermináveis e entreabertos


Voltar a superfície com os olhos vivos de sopro
Arranhar os labirintos mortos de saudade
Eu quero que toda letra
Se dissolva em melodia.





segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Instante

Ana Carolina


Da altura e tom de voz faz-se a elegância
O porte irreverente com um simples sorriso

A brisa suave que acarinha o rosto  
É o suficiente para adornar tua beleza

Se relevantes fossem as maçãs do rosto avermelhadas
E os olhos cor de água mansa acarinhada por segredos

Ressaltaria o brio confuso de doçura sobre-humana
E tão macias são tuas expressões

Deixaria que as pétalas debruçassem-se sobre o solo
Naturalmente, como teus dias de cores vibrantes.


Para Márcia Stumpf